Turco-brasileiro preso pela PF a pedido do governo Erdogan é dono de restaurantes em SP, casado com brasileira e deu aulas na USP
01/05/2025
(Foto: Reprodução) Mustafa Göktepe é rival do governo turco e foi preso por determinação do STF. Governo Erdogan acusa empresário de integrar organização terrorista. Empresário e professor turco-brasileiro Mustafa Götkepe
Reprodução/TV Globo
O empresário turco-brasileiro preso na quarta-feira (30) em São Paulo pela Polícia Federal (PF), por determinação do Supremo Tribunal Federal (STF) a pedido do governo da Turquia, é dono de uma rede de restaurantes na capital paulista. Além disso, é casado com uma brasileira, com filhos nascidos no Brasil. Ele também deu aulas como professor visitante da Universidade de São Paulo (USP).
Mustafa Göktepe tem 47 anos. Ele foi detido porque o governo do presidente da Turquia, Tayyp Erdogan, o acusa de integrar uma organização terrorista. Por meio de nota, a defesa do empresário negou a acusação, informou que a prisão é ilegal e que seu cliente sofre perseguição política por ser opositor de Erdogan (leia abaixo a íntegra).
A ordem para prender Mustafa foi dada pelo ministro Flávio Dino, do STF. A prisão contra o empresário é cautelar para fins de extradição. Ou seja, o objetivo é enviar o turco-brasileiro para o seu país de origem, onde deverá ser submetido às leis turcas.
Naturalizado brasileiro desde 2012, Mustafa é o proprietário da Lahmajun Delícias Turcas, com cinco unidades em São Paulo, incluindo um restaurante dentro de um shopping. Junto com a esposa, a brasileira Alessandra Göktepe, teve duas filhas, uma de 8 anos e outra de 13. Ambas também nasceram no Brasil.
Mustafa ainda é tradutor turco juramentado e deu aulas da língua nativa como professor visitante na USP. Considerado uma figura influente na comunidade turca em São Paulo, ele lidera o Instituto Pelo Diálogo, organização voltada a discutir questões interculturais entre pessoas de diferentes religiões.
Segundo seu advogado, Beto Vasconcelos, ex-secretário Nacional de Justiça, "não há razão para a prisão". "Primeiro, porque ele não pode ser extraditado por ser brasileiro naturalizado. Segundo, porque ele não tem razão nenhuma para fugir, pois está aqui há mais de 20 anos, se naturalizou, vive com sua família, esposa e filhas e tem sua atividade profissional no país."
Ainda de acordo com seu advogado, Mustafa veio ao Brasil em 2004, após ser perseguido politicamente pelo regime governante na Turquia. O empresário fazia parte do Hizmet, movimento islâmico turco liderado pelo clérigo Fethullah Gülen, que morreu aos 83 anos durante exílio autoimposto nos Estados Unidos.
Gülen foi um antigo aliado de Erdogan, mas eles se desentenderam e o presidente o responsabilizou pela tentativa de golpe de 2016 em que soldados comandaram aviões de guerra, tanques e helicópteros.
Mustafa é dono de uma rede de restaurantes de comida turca em São Paulo
Reprodução/Rede social
O que diz a defesa de Mustafa
"O pedido de extradição do Governo Turco é uma violenta e ilegal perseguição política. Mustafa é brasileiro naturalizado há 13 anos, mora no Brasil há 21 anos, é casado com uma brasileira, pai de duas filhas brasileiras, empresario, professor visitante na USP, conhecido pela defesa da democracia, tolerância política e religiosa.
Este é mais um capítulo da triste história do autoritarismo do Governo Turco, que tenta usar ilegalmente os processos de extradição como instrumento de perseguição política extraterritorial, para submeter pessoas aos seus tribunais de exceção e a graves violações de direitos fundamentais.
O STF, por duas vezes e de forma unânime, já negou pedidos idênticos a este. Tenho confiança de que, assim que o STF receber nossas informações, revogará a prisão e negará a extradição", informa nota divulgada por sua defesa.
O advogado do empresário informou ainda que estuda entrar nesta semana com um pedido na Justiça contra a decretação da prisão para que ela seja revogada. Segundo Vasconcelos, o governo Erdogan, "tenta usar ilegalmente os processos de extradição como instrumento de perseguição política".
Mustafa é "conhecido pela defesa da democracia, tolerância política e religiosa", segundo a defesa dele. O advogado alega que seu cliente "não pode ser extraditado" e as alegações do governo turco para a sua prisão "são todas posteriores à naturalização" dele como brasileiro.
"Milhões de pessoas de todas as partes do mundo, assim como eu, tiveram suas vidas orientadas e foram inspiradas pelos ideais por Fethullah Gülen Hocaefendi, que hoje faleceu. Que Allah tenha misericórdia dele. Que eu seja seu vizinho no além", escreveu Mustafa em seu Instagram.
Acusações
Empresário turco-brasileiro Mustafa Göktepe
Reprodução/Instagram
O despacho do ministro Dino informa que Mustafa é acusado pelas autoridades turcas de integrar a organização terrorista armada FETO/PDY, ligada ao clérigo Fethullah Gülen, apontado pela capital Ancara como mentor do golpe de Estado frustrado de 2016.
A decisão do ministro do STF foi assinada na última semana e autoriza a Polícia Federal a cumprir o mandado, que deveria ser mantido em sigilo até a efetiva detenção do extraditando.
De acordo com o texto, a conduta atribuída ao acusado tem equivalência penal no Brasil, com base na Lei 12.850/2013, que trata de organizações criminosas, o que configura dupla tipicidade, um dos requisitos para a extradição.
A ordem de prisão contra Mustafa foi emitida pelo 6º Juizado Criminal de Paz de Izmir, na Turquia, em 5 de abril de 2024, e o crime imputado teria ocorrido em 10 de abril de 2017, com prescrição prevista apenas para 2029.
O ministro argumentou que o pedido do governo turco cumpre os requisitos exigidos pela Lei de Migração brasileira (Lei 13.445/2017), como a apresentação de documentos que identificam o acusado, descrevem os fatos e atestam a ordem judicial emitida pela Turquia. Dino destaca ainda que não há impedimentos legais para a extradição: Mustafa não é brasileiro, não responde por crime político ou de opinião, e não há processo sobre os mesmos fatos no Brasil.
“Decreto a prisão para fins de extradição de Mustafa Göktepe, nos termos do art. 84, §§ 1º e 2º, da Lei nº 13.445/2017”, escreve o ministro.
A decisão ocorre em meio a críticas à política brasileira de cooperação com a Turquia no caso de perseguições políticas contra membros do movimento Hizmet.
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