Desaparecimento de animais dispersores de sementes ameaça luta contra clima extremo

  • 09/07/2025
(Foto: Reprodução)
Perda de ‘jardineiros’ naturais significa que menos sementes serão espalhadas e menos árvores crescerão, enfraquecendo a defesa contra as mudanças climáticas. Os tucanos são grandes dispersores de sementes e, ao se alimentarem de frutas, ingerem as sementes e as depositam em locais distintos por meio de suas fezes Leonardo Vilela/TG Em silêncio, de galho em galho ou de rio em rio, alguns animais “trabalham” para garantir que nossas florestas sigam de pé. São aves, macacos, antas, cutias, peixes como pacus e tambaquis, que carregam as sementes que farão brotar a próxima geração de árvores. Mas esse trabalho essencial está ameaçado. O desaparecimento dos animais frugívoros – aqueles que se alimentam de frutos – já altera a forma como as florestas se regeneram e afeta, silenciosamente, a capacidade de árvores e matas de absorver carbono da atmosfera. Indivíduos de jacutinga foram soltos próximos ao Parque Estadual do Rio Doce Edgar Fernandez Menos dispersores significa menos sementes espalhadas, menos árvores crescendo e, na prática, menos chance de frear as mudanças climáticas. “Quem planta carbono na floresta não somos nós: são os tucanos, as cutias, as antas, as jacutingas. Se a gente quer falar de restaurar florestas, precisa incluir esses animais na conta”, alerta o biólogo Mauro Galetti, do Centro de Pesquisa em Biodiversidade e Mudanças do Clima (CBioClima), da Unesp. Cutia (Dasyprocta) uma das 'Jardineiras da Floresta' Projeto Hapia/Carlos Tuyama Um estudo recente, liderado por Galetti e pesquisadores de vários países e publicado em maio deste ano na revista Nature Reviews Biodiversity, mostra que 90% das árvores da Amazônia e da Mata Atlântica dependem de animais para se reproduzir, ou seja, que comam o fruto e levem a semente para outro lugar. No Cerrado, essa dependência chega a 60%. O problema é que muitos desses animais estão desaparecendo e deixando as florestas vazias. E o impacto vai além do sumiço das espécies. Sem esses “jardineiros da floresta”, a própria estrutura das matas muda: árvores grandes, que capturam muito carbono, dão lugar a plantas menores e menos eficientes para estocar CO₂. É como se a floresta perdesse força para enfrentar os extremos do clima. A anta é o mamífero terrestre mais pesado da América do Sul, um adulto pode pesar de 180 a 300 kg Marcelo Moraes/TG Um trato especial para cada semente Ao devorar o fruto, o animal engole a semente, que recebe um “tratamento especial” no estômago ou na moela. Depois, ao ser expelida, ela chega ao solo pronta para germinar longe da planta-mãe, escapando de pragas e competindo menos por água e luz. Sem esse transporte, muitas sementes nem saem do pé. É o caso da castanha-do-pará, que conta quase que exclusivamente com a cutia para espalhar suas sementes. Muriqui-do-sul tem a face negra e os pelos do corpo são beges Fabiano Melo/ Arquivo Pessoal “Se a cutia sumir de um lugar, o serviço de dispersão desaparece junto. É um serviço ecológico fundamental que depende desse bicho”, destaca Galetti. Peixes jardineiros e florestas que nadam Nem só de bichos da terra vivem as florestas. Na Amazônia e no Pantanal, peixes como pacus e tambaquis são verdadeiros superdispersores. Eles nadam quilômetros, engolem frutos inteiros e carregam sementes pelas matas alagadas, conectando margens, florestas de várzea e áreas ribeirinhas. Sabiá-una é conhecido também como sabiá-preta e sabiá-da-mata Leonardo Vilela/TG Sem eles, parte importante da floresta se perderia. Afinal, muitas árvores dependem dessa “carona aquática” para chegar a novas áreas. O descaso silencioso Enquanto as abelhas e outros polinizadores ganharam as manchetes e as preocupações da sociedade, já que sua ausência derruba diretamente a produção de alimentos, os frugívoros raramente aparecem no noticiário. Seus impactos são mais lentos, espalhados ao longo de anos ou décadas. “É um problema menos visível, mas que mina a floresta por dentro”, explica Galetti. Mico-leão-preto é um dos primatas mais raros e ameaçados do Mundo Ananda Porto/TG “A restauração não é só plantar árvore. É pensar quem vai manter essa floresta no futuro. E isso quem faz são os animais. Antes se acreditava que, ao plantar, os bichos ocupariam as florestas naturalmente. Mas não é assim tão simples”, completa. De acordo com o pesquisador, manter os frugívoros na paisagem é uma das formas mais baratas de enfrentar o aquecimento global. “É preciso entender que florestas vivas precisam de animais. É essa parceria que garante árvores mais diversas, que capturam mais carbono, protegem rios, regulam o clima e sustentam toda a vida ao redor”, resume. O que ameaça esses “jardineiros”? A lista de ameaças é longa: destruição de florestas para abrir pastos, queimadas, uso indiscriminado de agrotóxicos, caça ilegal, tráfico de animais. Grandes frugívoros – como macacos, antas, aves de grande porte – são os mais vulneráveis. E sem eles, todo o equilíbrio da floresta fica comprometido. O tangará consome frutos e deposita as sementes em galhos Leonardo Vilela/TG Para Galetti, é hora de incluir esses animais em qualquer plano de restauração. “Sem tucanos, macacos, pacus e cutias não existe floresta funcional. É como construir uma casa e esquecer a estrutura que a mantém de pé”, compara. A ciência já deixou claro: proteger florestas não é só cercar uma área e esperar que tudo se recupere sozinho. É preciso garantir que os dispersores de sementes estejam lá, circulando livres e espalhando vida. VÍDEOS: Destaques Terra da Gente Veja mais conteúdos sobre a natureza no Terra da Gente

FONTE: https://g1.globo.com/sp/campinas-regiao/terra-da-gente/noticia/2025/07/09/desaparecimento-de-animais-dispersores-de-sementes-ameaca-luta-contra-clima-extremo.ghtml


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